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09/01/2017

Os fios que deixei pra trás


No final do último ano eu pensava que já havia vivido muito e aprendido demais. Passei por milhares de transformações e precisava de algo que marcasse o começo de uma nova era, uma nova mulher. A primeira coisa em que pensei foi cortar o cabelo! Uns apoiaram, outros ficaram no ‘’ah, mas você tem um cabelo tão bonito’’, minha mãe pirou, mas no final acabou cedendo. E assim, fui para o salão toda feliz e saltitante porque em breve teria um novo cabelo. Um novo rosto. E uma identidade limpa, pronta para ser preenchida por um novo ano.

Alegria não faltou quando Joana, a cabeleireira, mostrou-me o resultado no final. O salão era perto da minha casa, então vim correndo e sorrindo para todos que por mim passaram naquela tarde. Dava vontade de parar as pessoas só para dizer ‘’esse é o meu novo cabelo, você gostou?’’. Chegando em casa foi mais um misto de felicidade sem fim diante dos elogios e claro, utilizei de toda nova tecnologia para mandar fotos até para a minha avó que mora no Rio. Ela quis chorar quando soube que a princesa havia cortado um dos seus bens mais preciosos. ‘’Eu sou a Rapunzel, Vó. Agora tá curtinho, mas com o tempo cresce’’ pensei comigo.

E cabelo é algo que cresce mesmo, e não sei o das outras pessoas, mas o meu cresceu numa velocidade que quando dei por mim lá estava todo aquele volume e comprimento de antes. Só que com o crescimento dos fios, vieram os ensinamentos de mais um ano. Parecia que a cada nova pedra retirada do caminho ou a cada montanha em que escalava mais ele crescia. Com esse ano eu cresci e pude acompanhar todo meu crescimento por algo que vive sempre tão juntinho comigo, e na minha cabeça. Quando ele não era cuidado, era sinal de que as coisas estavam ruins e eu não estava me cuidando. Mas quando ele estava fofinho, todos os cachinhos se incendiavam e diziam que, pelo menos naquele momento teríamos alegria.

Encerro mais um ano com ele curtinho. Cortei ontem e a sensação de ‘’sou a mulher mais bonita do mundo’’ me domina desde quando a Juliana, a cabeleireira dessa vez, disse ‘’É assim que você quer, Julia?’’. Mais uma vez passei por todo um processo de ‘’vai cortar’’ ‘’não vai cortar’’, mas dessa vez menor porque foi só o tempo de dizer ‘’Mãe, marca com a Ju que hoje eu quero cortar’’ e claro, com uma promessa que antes de tirar metade da juba iria ver revistas com modelos de cortes. ‘’Vai que você se arrepende e não gosta. Um corte vai ficar tão lindo’’. Coisas de mãe. 

Depois que saí do salão parecia que o mundo havia me abraçado e eu o abraçava de volta. A semana começou melancólica, mas hoje tudo fez mais sentido. Os dias pareceram ter mais cores e finalmente a chuva que eu tanto esperei ontem, chegou. E ainda me trouxe um arco-íris! Com os fios que tirei deixei para traz não só metade do meu cabelo, mas todas as coisas ruins que precisavam ir embora com aquelas pontas queimadas. Peguei tudo de bom que aprendi no ano em que se passou e com isso vou seguir adiante.

Desapego é a minha palavra do final de ano. Descarrego é o que pretendo fazer durante estes dias que antecedem o tão esperado – e assustador – trinta e um de dezembro. Sinto que já deixei tudo que precisava deixar para trás. E ao longo do ano, se for pesado demais, eu repico um pouco aqui, um cado ali.

Cabelo cresce rápido. Assim como a gente. E ás vezes, talvez sempre, precisamos nos podar para seguir adiante. Afinal, um cabelo tão bonito não merece pontas tão ressecadas. 


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